quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Parto por mim

"Mamãe achará que a culpa é dela, por não ter sido mais severa, ter me passado mais valores, dar-me uma educação mais rígida. Acha que me deu liberdade de mais. Que não aprendi a valorizar as coisas."

"Papai é o oposto, achará que o trânsito entre a rigidez da minha mãe e a semiliberdade que ele me dava,fizeram com que eu fosse, na verdade, refém de tudo, não adquiri o discernimento necessário das coisas e pessoas, e por isso acabei assim."

Mas, será que é tão difícil entender que não há um culpado? Não houve crime para haver pena! O texto da lei é claro, quando há a infração de uma lei, aplica-se uma sanção, uma punição, uma pena. Tenho pena das pessoas, que ao ver minha situação, acreditam que estou "pagando" por algo.

"Ora, o fato, é que eu optei por isso. Partiu de mim. Eu quem quis. Autonomia da minha vontade. Mas, para as pessoas, não. Há alguém."

Acho que entendi parte da jogada... É que nós, seres humanos, não suportamos o que vemos diante do espelho da vida, teimamos em admitir e aceitar nossa condição de imperfeitos, insaciáveis. Daí, temos por hábito, atribuir aos outros, aquilo que não aceitamos em nós. Culpamos aos outros.

Eu tenho tentado fugir à regra e tenho olhado profundamente para mim mesma, ver o que há em mim que quero negar. E foi assim que cheguei a conclusão que fui tudo uma escolha minha. E também já sei o que quero negar.

"Eu poderia dizer que a culpa é do Leandro. Que depois de dois anos de namoro, casamento marcado, convites enviado, vestido pronto ter desistido de casar comigo. Poderia dizer que a culpa é da Selminha, que sabia que já há três anos eu aguardava àquela promoção na empresa, mas, começou um caso com chefe e ficou com o cargo.  Poderia dizer que a Livia traiu minha amizade ao namorar o Flávio, o infeliz de quem eu fui vítima. Poderia listar diversos culpados."

Eu poderia dizer também que  você, leitor, tem culpa, por se alimentar de minhas palavras mesmo sabendo que já não me alimento mais.

Mas nada disso seria verdade. Será que vão me odiar pelas escolhas que eu fiz? Posso estar sendo egoísta e magoando muita gente querida. Mas, já não posso viver em função dos outros, para manter outros felizes sem me sentir assim também. Não dá. Tentei, mas fracassei.

Assino essa despedida, paro, reflito, penso na minha vida e tenho certeza da minha sina: dormir profundamente sob os efeitos de uma droga assassina. Não me odeie. Mas, me ame. Pois, o que eu quis negar diante do espelho era o amor. Amor próprio. Amor óbvio. Amor.

Só não adianta procurar culpado para isso e aquilo. Eu escolhi não ter mais que escolher, assim não terão que se preocupar com minhas atitudes. Eu escolhi não viver. Eu escolhi.

Parto por mim.

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É com pesar que comunicamos o falecimento de Ellen Taheé, ocorrido na madrugada desta quinta-feira (14/10), vítima de suas escolhas, traída por sua intuição, desiludida pela realidade, algoz de sua própria condição. "Parto por mim", quis ela assim.

























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