sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Discurso sobre algo que não existe (Explicando o nada)

Não tenho nada a declarar a vocês. Podem chorar, se espernear, mas, essa é a verdade: nada. Sintam-se privilegiados! Eu poderia querer dizer tudo à vocês. E dai, teriam de me ouvir (ler) por toda a eternidade. Ainda bem que é ao contrário. Ou não! Acabo de ludibriá-los e cheguei a uma complexa situação! Dizer que não tenho nada à dizer para vocês, já é dizer algo. Logo, acabou-se o nada. Tenho dó de nada. O coitadinho não pode viver. Toda vez que o percebo, ele começa a morrer. Vocês são testemunhas, verão que não estou à mentir. Quando disse que nada teria a dizer, comecei a me desmentir, pois, já estava dizendo, mesmo dizendo que não tinha o que dizer. Ai que complicação. Percebe que agonia? Assassinamos o nada muito sutilmente. Ele não havia me feito nada. E por isso mesmo morreu.
Não gostamos do nada. Eliminamos o nada. É só notar sua presença que já começamos a vitimá-lo. Não, não me interrompa, se não começo também a ignorá-los. Nada é por acaso. Sim, foi por acaso que o criaram. Tentavam explicar o que não tem explicação - como quando você está aprontando algo e sua mãe pergunta o que você está fazendo e você responde "nada", pois, não dava para explicar - Note que o nada pode ser útil, precisavam nomeá-lo. Então batizaram ele de "nada". Só que era pura ilusão. O inexplicável não se pode explicar, por isso é inexplicável (é tão difícil de entender???).
Assim ao criar o nada, ocupamos o que não deveríamos ocupar. Por isso temos essa contradição, de quando notarmos que algo poderia ser nada, acabar por fim com sua breve experiência de "vida".
Eu não tinha nada à dizer e acabei por falar mais do que deveria. Essa é a prova cabal de que eliminamos o nada de nossas vidas. Só o invocamos em situações em que queremos tirar vantagem, desde quando nos explicamos dizendo que não estamos "fazendo nada" e estamos na verdade aprontando; passando pela prontidão ao dizer que no "fim de semana não tenho nada para fazer" para que seu amado(a) o convide para sair; até quando você resmunga alguma coisa ruim e quando pedem para você repetir, você se livra  dizendo que "não era nada".
Aliás, tem frase mais sem sentido do que essa: "Não era nada"? O NÃO nega o ERA, que deixa de existir e deixar de existir é NADA. Logo, não era nada, nada mais é do que afirmar e reafirmar nada nada. E "não estou fazendo nada" então? É pegar com a boca na botija! O NÃO nega a ação de fazer algo, no caso nada. Então ele nega que está fazendo nada, deixando de existir, vazio. Logo,  a frase serve para afirmar que ele, na verdade, está fazendo algo. É quase uma confissão: "Filho o que foi esse baralho ai em cima?", ai vem a brilhante resposta, "Que barulho mãe? Não estou fazendo nada!". Tradução: "Filho me engana que eu gosto?", filho: "tá bom mãe! Nego que estou fazendo algo que não existe" ¬¬.  E aquela - a melhor de todas! - "O que você quer ganhar de presente querida?", namorada responde "Ah meu amor, quero nada não, só você me basta". Análise profunda: "Ah meu amor", significa, "tô te agradando"; " quero ganhar nada": o não no final da frase inverte o significado, quero ganhar algo que existe; "só você  me basta", o uso do "só" revela que trata-se de algo pouco, além do que, a frase é irônica e pode ser interpretada como "você é pouco, me compense!". Assim "ah meu amor, quero nada não, só você me basta" é, na verdade, o mesmo que "to te agradando, quero algo que existe, pois você é pouco e preciso ser recompensada".
No fundo, no fundo, o nada sempre tá complicando nossa vida. Nada complica nossa vida. E para quem não queria dizer nada (logo, queria dizer algo que não existe) eu já falei muita coisa. Boa noite. E parem de fazer coisas que não existem por aí. Tá pensando o que? Que eu não sei nada sobre isso? Hunf!

3 comentários:

  1. Eita, queria dizer nada! Mas o nada aqui significa: Genial, envolvente, despojado, louco! Parabéns Brenda! Simplesmente adorei seu texto!

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  2. " Talvez nada, seja só mais uma palavra esperando tradução. " Eu adoro pensar sobre o nada Brenda, e meditar o quanto as pessoas se martelam ao tentar denominá-lo. Me intriguei bastante lendo seu texto, e admirei-o. Parece-se comigo. "Que eu não sei nada sobre isso? Hunf! "

    beijos.

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  3. Ah, Brenda!
    Ficou perfeito...
    Também, de você eu nem esperava coisa melhor, né? Nem dá, Brenda, nem dá. Você é incrível...

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